Do durável ao descartável




Lembro-me da época em que as coisas eram feitas para durar. O vendedor na loja garantia que o produto comprado atenderia as necessidades do freguês pela vida inteira! Fui criada com o conceito do durável que abrangia família, amizade, casamento, conhecimento, roupas, sapatos, objetos, enfim, tudo que pudesse ser e estar ao meu redor.

 Hoje, o durável não é mais a palavra de ordem.  Estamos na era do passageiro. O que importa é curtir o agora e quando não mais interessa partir para o novo. As coisas perdem a graça tão facilmente e as pessoas quando deixam de ser novidade são colocadas de lado. Quanto mais, melhor: mais informação, mais tecnologia, mais relacionamentos, mais tudo, mas tudo que se dilui na velocidade do tempo que segue rápido demais.

É a sociedade dos relacionamentos descartáveis, do relativismo conveniente, dos envolvimentos frágeis, estamos de passagem entre nós. Como as coisas não são mais para durar, por que as relações seriam? Se posso me satisfazer com móveis e veículos novos, por que manter a mesma pessoa ao meu lado? Estamos mais insatisfeitos do que nunca. A demanda é tanta para tanta procura!

Os vínculos estão mais superficiais e sem raízes, há o vício da troca e a necessidade do último lançamento do mercado. Relacionamentos que são baseados em interesses e não mais por afinidades, crescimento e companheirismo, que terminam sem nem mesmo terem começado de verdade. Casamentos chegam ao fim na primeira frustração. Namoros que acabam porque quanto mais, melhor. Porém, o vazio existencial aumenta. Sós na multidão são milhares. Porções individuais fragmentam o todo. Pessoas como ilhas. O egocentrismo fechando o indivíduo em si mesmo.

Faz-se necessário saber que não somos máquinas e nem materiais descartáveis. Que viver apenas para satisfazer-se torna a vida pequena demais e as vivências rasas. Que o ser humano não é produto de troca. Que as relações não são transações convenientes. Centenas de pessoas buscam o movimento contrário, acredito nisso, que ensinam aos demais, de passagem, que ficar também é bom, permanecer pode ser essencial e redescobrir o outro a cada tempo torna as relações mais prazerosas e sinceras. 





Andréa Freire
Psicanalista
Artigo publicado no Jornal Leia Mais / Sorocaba - SP
Outubro de 2012

Um comentário:

  1. Parabéns pelo seu texto Dra. Andréa, sou fã das coisas duráveis e tenho certeza de que sempre estive num terreno firme e fértil, assim fui criado e educado, vejo entre os jovens amigos de meus filhos que pessoas da minha geração migraram para os novos conceitos dos descartáveis, fragmentando a engrenagem do conceito duradouro que formaram grandes mestres e formadores de opiniões que até hoje nos servem como referência, sinto que este novo conceito aliena as pessoas a somente se preocuparem no ter deixando de lado o ser.

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